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Alexandra Rodrigues – Não me Torture, Seu Moço

Neste texto, Alexandra conta em prosa uma situação de abuso de poder e violência gratuita, muito recorrente nas comunidade periféricas.

 

 

Hoje eram 3 da madrugada, escutei um barulho muito forte na porta do meu barraco, corri pra saber o que estava acontecendo.

E estavam eles com uniformes pretos, encapuzados para não mostrar a face da opressão. Em suas mãos, ele, o fuzil.

A boa madrugada deles foi um “Deita! Deita! Não reage!”. Estas foram as palavras deles antes de me darem um soco no rosto e me derrubar no chão.

Minha filha acordou assustada da cama e correu pra me socorrer, mas foi abordada com a frase “quieta filha da puta, se não vai levar bala”. Estas foram as palavras que ela escutou antes de também ter que deitar no chão frio com coturno deles na cabeça dela e eu sem poder fazer nada.

Minhas roupas jogadas no chão, meu sofá velho sendo rasgado com um canivete. Pra que eu pedia respostas? Nenhuma saia da boca deles.

-Seu moço, sou mãe de família- eu disse. Pedi, implorei, mas mesmo minhas lagrimas não os comoviam, só ofensas eu escutava saindo da boca deles.

Outro soco, outro chute no estomago e perdi o ar, “se continuar a falar vai levar mais vadia”.

Depois de toda humilhação, eu tentando levantar do chão vendo eles saírem pela porta arrebentada do meu barraco, escutei um tiro, um grito, o silencio, e depois o grito de desespero de outra mãe.

Corri mesmo com muitas dores para ver. “meu filho, meu filho!”. Mais um jovem negro, chegando do trabalho, morto pelas costas por uma bala de fuzil. – Vagabundo não tem rosto -.disseram.

Como assim vagabundo? Quem está salvo dos assassinos de farda?

E aquela promessa de servir e proteger?

Genocídio das peles negras, humildes da periferia, por ser da periferia!

Quem liga, quem se importa? Só mais um negro morto. Quem chora? Problema é da família. “Estão cumprindo seu dever”, que dever??

Matar!!!

GENOCIDAS comandados por aqueles que foram eleitos pela a maioria da

população periférica, reféns do sistema hipócrita do governo, do presidente, do prefeito.

Subir a comunidade, falar em proteger, e a proteção é a bala de fuzil. Se correr, morre. Se ficar parado, morre. Abuso de poder!

A morte na periferia tem nome e usa farda, somos negros sim, somos humildes sim, somos, além de tudo, seres humanos e merecemos respeito.

ESTADO, NOSSO MEDO NAO É A PERIFERIA, NOSSO MEDO SÃO VOCÊS.

NOSSO GRITO É:

“NÃO NOS TORTURE MAIS, SEU MOÇO”.

RELATO :Alexandra rodrigues

Mulher periférica.

Sou capixaba da gema, tenho 21 anos e sou artesão bordadeiro. Estudo Artes Visuais na UFES e sempre me conectei com o movimento estudantil e o movimento LGBT+. Me liguei muito ao teatro, à dança e performance nos últimos 5 anos e agora venho me aproximando das práticas de meditação e yoga e desejo que tudo que eu me proponha a aprender sirva para que eu ensine melhor dentro de “salas de aula” já que além das artes, me interesso principalmente por Educação e desejo muito ser um bom professor. Acredito realmente que um bom professor salva vidas e tenho muita clareza de que só sobrevivi até aqui devido aos bons professores que encontrei dentro de escolas.

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